Não tenho noção da primeira vez que coloquei o pé no clube, mas lembro da época que a perna não alcançava o primeiro degrau.
O cheiro forte da cera se misturava ao cheiro dos charutos, cigarros, bebida...
As cadeiras de madeira escura, os sofás pretos, as cadeiras vermelhas.
O sol que invadia o salão de jogos...
Os tacos... o piso de madeira... o piso de taco... as janelas, as pombas... o mármore branco das escadas... o piano desafinado... o camarim com a janela quebrada... as sacadas, as cortinas, o teto... as pessoas...
A galeria de fotos...Os livros abandonados... a bocha... as cartas...
Os chocolates no balcão. O número do telefone... O João, o Modesto...
Todas essas coisas invadiram meu pensamento depois de ler um texto lindo de uma menina que eu não conheço... mas que compartilha das mesmas lembranças.
Ouvi sempre que o clube fazia parte da minha casa. Lá o meu avô tomava seus aperitivos, dividia o tempo com os amigos, com o irmão. Ele sempre fez questão de contar que o pai dele fazia a mesma coisa.
Lembro do fusca estacionado na porta do clube, das tardes frias na sala da bocha...
Dos pastéis... da voz dos funcionários atendendo minhas vontades... da voz rouca do meu avô pedindo para guardar segredo com relação aos aperitivos que ele tomava...
As aulas de balé do professor Arabutã Lima, depois as aulas da tia Monica... as apresentações, os teatros... os ensaios, os desfiles...
Do meu baile de debutantes... das senhoras da casa da Amizade arrumando nossos vestidos... lembro do salto do meu sapato no tapete vermelho... lembro de dançar com o meu avô no salão... lembro da orquestra do "João Roberto" tocando a valsa...
Como pode???
Quase posso ouvir a voz do Zamberlan falando meu nome...
Esqueci o que fiz ontem, mas não esqueço dos detalhes daquele lugar...
Os bailes, as brigas nas escadas... as pessoas... as festas de Natal. As barrigas das meninas grávidas... o lança perfume no banheiro...os olhares da Diretoria...das velhas fofoqueiras.
Depois do enterro do meu avô o único lugar que consegui pensar em ir foi no clube... pedi para entrar e na porta lembrei da perna que por anos não conseguia alcançar o degrau... lembrei do querido Sr Guilherme Filter, para quem não sabe, um alemão doce, educado, querido, pai da minha madrinha... lembrei da disposição da mesa dele e da pele branquinha e cheia de manchinhas... Lembrei da antiga secretária.
Lembrei da época que não havia catraca. Lembrei do orgulho que sentia em levar os amigos que não eram da cidades para conhecer o clube...
Enfim. A Luiza foi culpada pelo texto... Ela acendeu uma vela que sempre está dentro de mim... em uma tarde chuvosa, em que o meu filho acaba de escrever sua primeira história...

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